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Brincar de contar causo

Se aprochegue vivente, que eu vou começar um causo que se passou lá pras banda do Upamaroti...
Diz então que era Festa de Santo Domingo
O gaúcho, bagual que nem ele, colocou os arreio no mouro e foi pra festa, todo pilchado, com as vestimenta de ir pro povo, guaiaca cheia com os troco do soldo pra gastar.
Passando no bulicho do Susa, já deu uma apeada pra uma charla e umas canha, pra já chega meio pronto pros festejo e não fazer feio pras moça que ia encontrar no festerê.
Mas resulta que o moço não era muito chegado nos assunto de canha, e acabou tomando uma borracheira daquelas de fazer dó em cusco manco, e mesmo assim, se tocou pras "Três Venda", que ficava depois do paço, um bom par de hora no lombo do cavalo. E pra não chegar enjoado, o gaúcho pendurou na conta umas boteja de canha, pra ir tomando no caminho e não perder a animação.
Vai daí que o caminho já não era mais como antes, agora era uma de motocicleta, caminhão e até carro passeio passando pra lá e pra cá, diz que pra carregar cigarro contrabandeado lá das banda da linha.
E foi numa dessas curva que ia o gaúcho tranquilito, despacito no mouro, cantarolando as melodias de um tal de Adair de Freitas:
Lá na volta da estrada/Onde o dia renasce/Pintando o horizonte/Que o sol desenhou/Eu me vejo sumindo/E depois ressurgindo/Feliz por ter sido/E por ter a certeza/De ser amanhã/Como hoje ainda sou

Um gaúcho consciente/Da linha de frente/Se a liberdade/Estiver em perigo/Sou feliz, vivo em paz/Pois sou cada vez mais/Parecido comigo/Sou feliz, vivo em paz/Pois sou cada vez mais/Parecido comigo

(Eu sei bem pra onde vou/Porque sei d'onde vim/Pelos rumos que fiz/Eu não quero mudar/E nem devo mudar/Se, afinal, sou feliz)

Bueno, a cantoria e de tal maneira que o peão não viu quando passou um daqueles camburão preto, que mais parecia um chopim vira-bosta, e parando na estrada, esperava pelo cavaleiro, que ia no seu tranquito, solito e borracho, fazendo força pra não cair.

"- Bom dia, meu amigo, uma informação?"

E o cavaleiro passa adelante, como se não fosse com ele, fazendo pouco caso...

"- Meu senhor, preciso de uma informação, pode ser ou tá difícil, meu véio?"

A voz que saia de dentro do carro parecia de outro mundo, o moço era todo chiado e penteado, cheirando a perfume e frescura. O gaúcho, desconfiado, estacou no meio da estrada mas não apeou de saída.

- Seu, pode me informar onde fica a Associação dos Comerciários? Se é que tem Associação dos Comerciários aqui nesta Vila...

O gaúcho, no trago e se equilibrando em cima do cavalo para não se ir ao chão diz:

- Fica lá pros lado do bulicho da Dona Maria. Tu dobra pra isquerda e vai encontra uma casa véia. É lá.

E não deu muita trela pro moço que até era educado...

- Valeu cidadão pela informação.

O gaúcho pensa:

- Mas que home más do esquisito...

O gaúcho segue a cavalo na estrada de chão batido de poeira avermelhada....

(Segue adiante quem imagina o diálogo dos dois)

(sigo daqui Dani...)


Enquanto isso, no interior da Tucson, o playboy, um tanto arrependido de ter aceito o desafio feito pelo pessoal da seguradora – angariar sócios em um lugar bem remoto, no fim de uma estrada, no caso, a BR158, que termina em Santana do Livramento.
Cofiando os virtuais bigodes - pois ainda não os pudera cultivar, já que bigodes só combinam com casa, família e corolla sedan, e ele ainda não tinha dado esse passo rumo a eminente maturidade - ele refletia sobre duas questões existenciais fundamentais:
- onde é que eu estava com a cabeça quando resolvi atalhar pela estrada vicinal para ir até a cidade mais próxima e fui me meter nesse buraco...
- onde raios haverá uma pista de boliche nesse fim de mundo... Não deve ter movimento; será que eles chamam o jogo de bocha de boliche???
Atualizando os dados no seu GPS e reconectando o i-Pod no auto-falante e começou a pesquisar no smartphone para que lado fica esse povoado que tem até uma casa de boliche...certamente lá deverá ter sinal para celular, e ele então pedir uma ajuda mais fidedigna, para algum centro de relacionamento. Arrancou, levantando poeira e espantando uma família de tarrã que descansava na cerca, à beira da estrada.

Manso e quieto, o gaúcho seguiu seu caminho. Mas não pode deixar de pensar na pergunta do moço da cidade... Ele perguntou onde ficava a associação do que mesmo? Ah, deve ser a associação dos colonos, os “sem-terra” do loteamento que fica lá pras bandas do finado Manuel Dias. É, devia ser. Lá na subprefeitura não deve ter ninguém, deve estar todo mundo na Festa.

(passo a bola...myrtita)

é mesmo a guachada  de fato estavam todos numa grande festa, onde envolvia ginetiada e carreiradas, bastante trago e ovelho tradicional pastel de carreira,e comonão deixar de faltar o jogo da tava, onde a guachada faziam suas apostas, e em outro canto da festa na beira de uma cancha reta outros apostavam nas pastas de um velho quarto de milha que jamais em outras carreiradas havia perdido pois então no tal momento da vitória do quarto de milha se aproxima o boizinho da cidade a procura da tal associação, conversando com a guachada chega um outro gauchão mais largado e diz ao moço da cidade o rapazinho o senhor deve estar mesmo á a procura do assentamento dos sem terra, não é muito longe daqui o senhor volta até a porteira da entrada e vira para sua direita e assim o fez indo na direção no qual o gaucho lhe explicará, novamente encontra o gaucho que alguns momentos atrás havia lhe pedido informação, pensou vou seguir pelo caminho que o outro gaucho me ensinou, pois este gaucho cheio canha na guampa está mais para pedir informação do que dar

Eni Araujo ( passo a prosa adiante)


 ....O boizinho da cidade ou cola fina para os gaúchos segue em frente, pensando estar na direção certa.Passa uma, passa duas, passa três porteiras e nada da tal associação e o que é  pior a gasolina do carro termina e o pobre fica bem abichornado e resolve até sentar perto de umas macegas mas, nisso aparece um gaúcho pilchado a capricho pacholento com ar de quem sabe tudo de campanha. O rapaz cria alma nova quando o avista e diz moço preciso de ajuda. Como posso sair daqui? Parece que tu , tá meio atoa aqui não tem auto de praça o que eu posso fazer é consegui  um pingo meio lerdo pois tu é um baita maturrengo, que tu acha ? disse o gaúcho.O moço atordoado com tanta coisa que não entende, repete quero sair daqui, preciso voltar para a civilização.
O gaúcho com voz mansa diz: calma mosito, o senhor esta muito mariado, posso campiar uma carona com o pessoal que tão lá em casa pois, hoje é domingo dia de grande mosquedo. Ok, vamos lá diz o moço sem muita escolha.Passo adiante      

                         
JANE MAIRA .


Mas na verdade, entre seus botões, o cara não estava entendendo nada. E dizia para si: "Esse povo é todo louco...como é que o cara sabe que eu moro perto do mar, apesar que faz horas que não vou pegar uma praia...será que o cara sentiu cheiro de mar? Ou será que 'mariado' quer dizer perdido?"
- Sabe o que é senhor? eu só quero chegar até a vila, onde vocês tem uma associação comercial ou coisa que o valha. Preciso tentar um contato com algum líder local, para convidar os moradores das redondezas para oferecer um...
- Calma, seu moço, calma, toma uns gol de mate, não se ressabeie, que temos tempo pra conversar com acalma. Assim  que antes de me encontrar, cruzou pelo Bilica, peão lá estância do seu Honório Dias. Mas e o homi tava borracho? Mas não sabia que ele era disso. O pai dele sim, era um pau-dágua....pobre da véia Cema...
- Não sei se ele é borracheiro...não tinha cara, tinha mais jeito de trabalhador do campo mesmo. Ele tava fedendo a cachaça, devia estar muito bêbado, quase não se aguentava em cima do cavalo. Vai ver nem o dois conseguis fazer, que dirá o quatro.
O gaúcho, já meio sem entender o palavreado do rapaz da cidade, tentou continuar a conversa pra não parecer meio burro, e foi logo emendando "- Ah, sim, o Bilica nunca conseguiu aprender a ler nem o nome...conhece os número só quando ta camperiando, contando o gado no pasto.
O tal ricardinho, se sentindo já meio enjoado com o calor e aquela história, já estava quase pedindo pra sair...

Foi nessas aí que eu vi o carro parado na beira da estrada e calculei que alguém estava precisando de ajuda. Parei na casa do Manuelzão e a cena que vi nunca vou me esquecer. As expressões de alívio dos dois, quando me viram passar na caminhonete, buzinando e já meio parando. O Manuelzão, negro do olhos mais azuis que já vi, um homem grande e forte, de 1,90, mão forte e voz doce como de saracura, correndo desembestado pela carreteira, e atrás dele um minguelinho todo vestido de cowboy, bota de franja e cano fino, chapéu de couro, roupa justa e aprumado.
Duas figuras tão típicas e assíncrones, passando por uma experiência cultural que certamente eles nunca vão conseguir entender, e por conseguinte, no máximo vão dar muita risada, e eu, sujeito fronteriça dessas realidades, circulando um pouco lá, um pouco cá, fruto de minha herança familiar e de minhas escolhas profissionais, buscando explicar como surgem os mal entendidos oriundos das diferenças culturais.
O final desse causo vocês deduzem bem se imaginam que terminamos na Sarandi tomando uma patrícia bem gelada na city. Eu e o tal ricardinho, por que o Manuelzão foi pegar o Bilica la nas bandas das Três Vendas.
E tudo termina em canha, como bem manda a tradição no Brasil.

(os personagens e eventos dessa história são fictícios, não há nenhuma relação com qualquer evento da vida real)

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